Quando eu era
menino, as pessoas grandes costumavam me perguntar, com um
certo ar de superioridade: "Quem é que nasceu
primeiro: o ovo, ou a galinha ?", e eu ficava todo ressabiado
para responder. Mas quando eu fiquei grande, eu aprendi que
Deus criou os animais e não, os ovos dos animais e,
portanto, é lógico que quem nasceu primeiro
foi a galinha !
E agora, talvez por forra, eu
costumo perguntar às pessoas grandes que se gabam de
conhecer a fundo as coisas de Paquetá: "O que
surgiu primeiro, a Fazenda de São Roque ou a Capela
de São Roque ?". "Foi a Fazenda que deu nome
à capela ou a capela que deu nome à Fazenda
?". E então vergo-me ao ver as pessoas ressabiadas,
à busca de alguma resposta que faça sentido.
Mas eu acabara de descobrir a
resposta para esta pergunta, e estava cheio de alegria por
isso. Foi no livro das Visitas Pastorais de Monsenhor de N.
S. da Piedade, de Magé, à qual pertencia a ilha
de Paquetá. Tal visita ocorreu no ano de 1794 e nesta
Monsenhor Pizarro analisou todos os Livros de Tombo daquela
Freguesia e, então referido-se à nossa capela
de São Roque, disse que ela foi construída por
Manoel Ferreira Carmelo, que foi o "provedor da devoção
de São Roque na Ilha de Paquetá". Ora,
já sabíamos que a Capela havia sido construída
em 1698 e inaugurada e benta em 24 de novembro deste mesmo
ano, 133 anos após a metade setentrional de Paquetá
ter sido concedida em sesmaria a Inácio de Bulhões
(em 10/09/1565) e, assim, em 1698, Manoel Ferreira Camelo
já deveria ser o segundo ou o terceiro proprietário
na ilha sucessória de Inácio de Bulhões
e, portanto, a área da Fazenda já estaria bem
delimitada. Mas se Manoel Ferreira Camelo foi o "provedor
da devoção de São Roque na Ilha de Paquetá",
como nos disse Monsenhor Pizarro, é porque até
então a Fazenda ainda não tinha nome, e foi
o nome da Capela, proposto por ele, que deu origem à
denominação da Fazenda que, a principio denominada
pelo nome dos seus proprietários, deve ter passado
depois a ser chamada de "a Fazenda da Capela de São
Roque" que, em conseqüência, deu origem ao
nome de "Fazenda de São Roque".
Animado com essa descoberta, comecei
a imaginar como deveriam ter sido as comemorações
de São Roque nos dias 16 de agosto daqueles longínquos
anos. Quando teriam começado as quermesses ? E as Procissões
? E foi exatamente quando eu pensava sobre isso que apareceu
meu pai, um velhinho simpático, de 86 anos de idade,
e que foi garoto em Paquetá. E começamos então
a conversar sobre as Festas de São Roque dos seus tempos
de menino e ele então me disse que o que mais marcava
a sua lembrança em relação a isso era
o cheiro de Procissões.
O cheiro de Procissões
? perguntei. Era o cheiro do incenso do turíbulo ?
argui logo a seguir. Era o cheiro das velas que as pessoas
carregavam na procissão ?
Nada disso, respondeu meu pai.
Era o cheiro da canela ! O campo de São Roque era repleto
de caneleiras e quando ia haver procissão atapetavam-se
todas as ruas por onde ela passaria com as folhas dessas árvores,
e quando se pisava nelas exalava-se um cheiro maravilhoso
!
E foi então que eu pude
entender melhor a inspiração que motivou meu
pai quando em sua poesia sobre As Árvores de Paquetá
falou assim a respeito das Caneleiras do Campo:
"E nos seus ramos, pródigos de odor,
Amam-se os tiês castanho avermelhados,
Todos os sabiás apaixonados,
E os bem-te-vis, em escandaloso amor.
Mas nos dias de festa do Senhor,
As suas folhas pelo chão
Acompanham também a procissão,
Dando graças a Deus, por onde for."